Eunildes Martins Bonifácio Cerqueira, primogênita de seis filhos, mais conhecida pela família e amigos como Nide, nasceu em casa, na Fazenda Jenipapo, do seu avô paterno, no Arraial do Engenho de Água Branca, município de Mundo Novo, no dia 15 de setembro de 1927.
Viveu sua infância na zona rural, tendo gozado de todas as delícias de uma infância feliz com brincadeiras da roça, onde fazia bonecas com retalhos de pano, juntamente com suas irmãs, improvisando brinquedos que a sua imaginação permitia. Na idade escolar, ela e os irmãos foram morar em Mundo Novo, perto da casa da avó Maria Angélica, com quem aprendeu os primeiros pontos de bordado.
Como sempre gostou de estudar e de ler, quando mocinha foi morar em Ponte Nova, onde fez o curso de Enfermagem, que abriu caminho para vir estudar e trabalhar em Salvador, morando em um pensionato onde fez uma amizade de toda vida: Eduarda. Morando juntas, as duas solteiras e independentes, trouxeram o irmão caçula pra estudar na capital.
Como enfermeira, teve seu primeiro emprego na PROMATER e depois no ambulatório da fábrica de cigarros Souza Cruz, onde conheceu seu marido, Ivan Cerqueira, que trabalhava na ampliação da fábrica. Com ele casou-se em 12 de fevereiro de 1955 tendo as filhas Ivana e Ivany e em 1967 Ivan Junior, vivendo uma união muito feliz, com muita alegria, sempre com a casa cheia de muitos amigos e viagens por todo o mundo. Completou 62 anos de casamento, interrompidos pelo falecimento dele em agosto de 2017, ano em que celebrou seus 90 anos. Em fevereiro de 1969, a família mudou-se para a Pituba e como ficava longe da fábrica, com filho pequeno e condições financeiras melhores, Nide foi convencida a abandonar o trabalho. De temperamento alegre, irrequieto, prestativa e acostumada a trabalhar muito, se sentiu ociosa, buscando sempre ocupação. Não era dada a serviços manuais, aliás sempre dizia que não tinha coordenação motora desenvolvida por ser “da roça” e não ter feito curso infantil, então bordados, crochê, tapeçaria não serviam para preencher o seu tempo.
A Pituba nessa época era um bairro de veraneio, afastado do centro, com poucos moradores fixos, onde todos se conheciam. Logo Nide se tornou a enfermeira de plantão, aplicando injeções, fazendo curativos, e serviços afins. Numa dessas visitas, chamou sua atenção uma peça pintada em porcelana branca e ficou encantada despertando seu interesse em aprender essa técnica. Descobriu que Maria, essa nova amiga-paciente, era professora de pintura em porcelana, e iniciou seu curso, no horário que os filhos estavam na escola. Além dos grupos de artistas, Nide ainda foi membro ativa das ”Coroas da Pituba” e do Lions Club Salvador Pituba.
O encantamento se transformou em amor, se descobriu capaz, com habilidade e leveza nas mãos. Continuou se aperfeiçoando, buscando e dominando novas técnicas de pintura. Conheceu a cerâmica e foi tomar aulas com Zilma Mota integrando a memorável Turma das Quartas à tarde. Depois, sentiu vontade de retornar as aulas de porcelana, levou consigo sua amiga e vizinha Tânia Leal, que anos depois se tornou sua professora de pintura em tela.
Integrante da UBPP – União Baiana de Pintoras de Porcelana, ampliou o horizonte das artes conciliando as aulas de porcelana com as de cerâmica. As filhas nunca se interessaram pelas artes, mas Carolina, a neta mais velha, de tanto participar dos eventos, começou a pintar, inicialmente cerâmica com uns 8 a 10 anos e a acompanha nas artes desde então.
Participaram de dezenas de Exposições Nacionais e até organizaram e integraram juntas uma Exposição Internacional de Porcelana e Faiança em Salvador. Mesmo que não consiga mais pintar rosas nem tenha a mesma firmeza na mão, no auge dos seus 93 anos continua praticando a arte da porcelana .
Todos os filhos e netos, tantos de sangue como de coração, tem aparelhos completos de jantar pintados por suas mãos abençoadas, assim como vários sobrinhos e os amigos foram presenteados com verdadeiras obras de arte.
Os trabalhos que ela continua a presentear são prova de resiliência, força, sabedoria e criatividade. Mantém suas aulas, às quintas-feiras, com a professora Carmen Nagao e as inseparáveis colegas - amigas , onde paulatinamente foi se ajustando a suas limitações, mudando a técnica. Atualmente o clássico deu espaço ao moderno e lúdico e os grandes aparelhos foram substituídos por peças mais leves.
O resultado da obra continua encantando e impressionando a todos. Conseguiu tocar também o coração da sua 4a. geração: seu bisneto já ganhou uma caneca com dinossauro, as duas bisnetas não dispensam seus pratinhos de sopa e a última bisneta breve ganhará alguma surpresa em porcelana. E assim, a Nide nos ensina que tudo é possível, que a fé e a perseverança nos impulsionam e o amor por tudo que se faz, é um excelente combustível para a vida.
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